sábado, 10 de julho de 2010

EU ERA FELIZ E NÃO SABIA

Sou do tempo em que pulávamos os muros das casas com um simples alçar de pernas; Sou do tempo em que casas comerciais não eram isoladas com grades de ferro; Sou do tempo em alunos se levantavam em respeito a qualquer pessoa que entrasse na sala de aula: Sou de um tempo em que os “loucos de rua” não nos eram estranhos e tinham nomes: “Mãe Doida”, “Pê”, etc.; Sou do tempo em que favelas era coisa de cidade grande: Sou do tempo em que o povo inocentemente vibrava com o tricampeonato mundial(1970), enquanto nos porões da Ditadura, nossos irmãos eram torturados; Sou do tempo em que apenas alguns poucos maconheiros românticos e “outsiders” habitavam o imaginário das “moças de família”; Sou do tempo de se ficar ansioso para no outro dia apenas olhar o amor platônico.
É... Sou do tempo em que a música Sonhos de Peninha era chamada de brega; Sou do tempo da paquera e não do “ficar”; Sou do tempo de ser obediente a um simples olhar paterno; Sou do tempo do coração bater mais forte pelo simples toque na mão da garota desejada; Sou do tempo em que a virgindade dos adolescentes era ainda um tabu; Sou do tempo em que não se tinha receio de sentar na porta de casa e ficar papeando com vizinhos e amigos noite adentro; Sou do tempo em que tocar violão e cantar era coisa de vagabundo; Sou do tempo em que era fascinante brincar de bolas de gude, furão, carrinhos de latas de óleo com rodas feitas com pedaços de velhas havaianas; Sou do tempo em que crianças “perversas” e politicamente incorretas se divertiam com o zumbir das asas das tanajuras; Sou do tempo em que apenas “pescar” o “João-Turrão” do chão divertia as crianças. Enfim, aquelas brincadeiras românticas e artesanais, e a inocência ideológica dos tempos da nossa infância desapareceram. O interesse pelo conhecimento, o respeito aos mais velhos praticamente sumiram do coração dos mais jovens.
Responda-me Tempo, o que houve? Você que é o palco de todas as transformações! O Tempo, porém permanece mudo... Porque o tempo em si mesmo não tem força nenhuma de mudar nada. É apenas o cenário em que vivemos. Só nós podemos tudo mudar.
Municípios pequenos como o nosso, cuja população total não passa de 35 mil habitantes em todo o seu território e cuja sede não abriga mais que dez mil habitantes, a despeito da democracia política, estão hoje com os mesmo problemas sociais e econômicos das megalópoles.
A favelização da periferia, o desemprego, a insegurança, as drogas, a marginalidade e a impunidade nos deram o “status” de cidade grande. Mas em compensação, onde estão as “virtudes” de uma grande cidade? Onde está a maternidade, o pronto-socorro, o cinema, os bares noturnos e o anonimato “transgressor”?
O estado que não deu assistência à periferia dos grandes centros urbanos, é o mesmo que deixou prosperar nas pequenas cidades, os mesmos problemas sociais e econômicos das grandes cidades! O estado dos ricos em todas a suas formas e esferas: municipal, estadual e federal, busca por natureza a concentração de privilégios e os problemas do povo não são tratados com a devida justeza.
Porém, Não se pode responsabilizar apenas este setor da sociedade por todas estas transformações negativas porque passaram as pequenas cidades do interior deste país. A força principal destas transformações está na base econômica, na necessidade de mercado consumidor que a sociedade burguesa impõe. A tecnologização do mundo substituiu brinquedos artesanais pelos videogames e pelos jogos da internet. A intensa circulação de informações e o rápido acesso a grandes cidades, nos deram uma mentalidade parecida com o habitante de uma megalópole.
A redemocratização do país, após anos de autoritarismo nos colocou no outro extremo. O extremo do relaxamento do respeito e uma mal compreendida liberdade de expressão que não hesita em desrespeitar a liberdade do outro.
O hedonismo juvenil foi estimulado através da liberação do comportamento sexual e pela massificação do extremo mau gosto melódico e de letras, das músicas apelativas de duplo sentido. O ritmo repetitivo e banal substituiu o lirismo das letras. Em muitos sentidos houve uma espécie de deseducação popular.
O acesso livre as informações é um fato, entretanto, as classes mais desfavorecidas não foram educadas para valorizá-las. Se não se tem gosto e nem vontade, como poder ter prazer em ler um bom livro, ouvir música popular ou músicas clássicas. O valor destas artes não foi massificado pela grande mídia. A subliteratura (Sabrina e outras) carregada de sentimentalismo romântico é que preenchem as prateleiras das casas populares. Os livros de auto-ajuda e os “Paulos Coelhos” da vida conseguem vender 40 milhões de livros!. E o que é pior, têm público em todo o planeta!
É certo que saudosismos piegas são chatos e não são saudáveis. Mas reconheçamos que muitas vezes sentimos a sensação de que éramos felizes e não sabíamos.
Professor Ari, O Iconoclasta. (comentários enviar para o Email e Orkut: arivaldodesouzadantas101@gmail.com)

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