terça-feira, 25 de março de 2014

Filoso-FÁ



Uma música é um texto com ritmo e melodia.
Pode ter conteúdo romântico, alegre e triste.
Pode contar histórias.
Entretanto qualquer texto musicado terá uma característica
da qual jamais fugirá, ele sempre trará consigo, uma mensagem
e nesse sentido sempre será um texto filosófico.
A filosofia é uma visão de mundo. Um jeito singular de percebermos a vida.
As visões de mundo de forma bem esquemática podem ser transformadoras ou conservadoras.
Os textos musicados estão cheio de AFORISMOS, de pequenas verdades e de verdadeiros tratados filosóficos.
No Lepo Lepo, sucesso recente da axé-music, por exemplo, está clara a mensagem. A parceira terá que enxergar as "virtudes", o carisma, o sexy apeal do seu parceiro que não tem nada material: casa, carro, essas coisas, para poder ficar com ele. A resposta de Ivete a esse sucesso do último carnaval dessacraliza as mulheres trabalhadas em programas de computador para parecerem perfeitas. Gerou mesmo um debate, um saudável confronto entre gêneros. A menina da internet fez uma versão dizendo sabiamente que só o "lepo, lepo" não garante a afeição, o desejo de uma mulher.
Como não ver um aforismo também, nesse fragmento da música Por Enquanto interpretada por Cássia Eller: "mudaram as estações, nada mudou, mas eu sei que alguma coisa aconteceu, está tudo assim, tão diferente".
Tanta intensidade de sentido e de verdade em tão poucas palavras!
Como negar que o real apesar de nunca se repetir e de estar sempre em constante mudança carrega consigo um inalterado e ontológico ranço de permanência.
Permanências lembrada teoricamente pela escola francesa da revista Annales. Fernand Braudel afirma que a hierarquia social é uma permanência, uma longa duração.
Estou me lembrando que Caetano já musicou esse aforismo: "se você tem uma ideia incrível é melhor escrever uma canção, porque está provado que só é possível filosofar em alemão". Ou será que só é possível filosofar em francês? rs
Quantas outras permanências podemos identificar nesse jogo social insano que reproduz a desigualdade social com tanta eficiência? A relação entre vereadores e prefeitos, entre o executivo e o legislativo atende às necessidades do povo? Ou só faz como tem sido feito há milênios, um faz-de-conta institucional que quando não gera novos ricos, torna os ricos mais ricos ainda?
O poeta da indignação, o genial Cazuza nos lembrou que vivemos num "museu de grandes novidades". Uma frase definitiva que nos remete à paradoxalidade e à dialética da convivência entre a permanência e a mudança.
Os textos musicais também nos emocionam. Nos remetem a um clima cinematográfico. Como se a gente pudesse se sentir ao lado de Belchior "dentro o carro sobre o trevo a cem por hora!" Ou voar com Roberto nas "curvas da Estrada de Santos" enquanto a gente vê "o nosso amor na distância se perder".
A música é tudo! Nos ensina, nos alegra, nos emociona, nos eleva a Deus, nos deixa nostálgicos.
Lembro-me muito bem quando Gal Costa,Djavan e outros de igual calibre, ganhavam prêmios de melhores cantores ou da melhor música. Hoje temos que engolir numa tragada só Annita e Luan Santana!"
Então perplexamente eu pergunto: onde está a permanência histórica na MPB? Em vez disso a história nos "brinda" com outras permanências.
Ari, O Iconoclasta